quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

O Nixon


O Nixon foi o sujeito mais divertido que conheci, sem que se esforçasse para isso. Era naturalmente engraçado. Costumava usar um paletó xadrez, que as más línguas contavam ser ferramenta para emergências. Se houvesse necessidade, ele o estendia na calçada e montava o piquenique. Era o estilo toalha de mesa legítimo. E o Nixon, nem aí para as maledicências dos amigos. Tinha dois riscados no puro gabardine.

Certa vez, descíamos a Gonçalves Dias para as nossas rotineiras visitas a empresas, para a manutenção de contratos e captação de novos clientes. Éramos caçadores de mão de obra temporária. Num repente, usando o meu ombro como cabide, ele soltou uma sonora gargalhada. Procurei nos passantes o inusitado e ninguém era motivo de galhofa.

— Galhardão! Era assim, no aumentativo, que ele me tratava. Embora a sua estatura me deixasse no chinelo.

— Você não vai acreditar! Pra não acordar a Cida, hoje cedo, tirei a roupa como ladrão. Foi no mais completo silêncio. E olhe o resultado — olhava para o chão a rir de si próprio.

Nixon havia calçado um sapato azul e o outro preto.

Noutra feita, estávamos nós no subúrbio do Méier, encapados de grã-finos e com uma fome de três dias.

— Galhardão! Vamos fazer uma boquinha na casa do meu irmão!

— Não, Nixon! Vamos incomodar!

— Deixa de bobagem! O que incomoda é essa fome de varar o estômago!

E lá fomos nós para a casinha de presépio, como pareciam as casas da Zona Norte, antigamente. Nixon tocou no portão e logo surgiu uma jovem senhora.

— Cunhadinha, viemos filar a boia!

A moça nos olhou enviesada e mandou a letra de quem não gostara da surpresa:

— Estou lavando roupa, Nixon! Não fiz comida. Improvisa algo!

— Tem macarrão?

— Pega no armário. O molho está na geladeira. Vou pros meus afazeres de doméstica. Não tenho empregada. Se vira!!!

E saiu solene, rumo aos fundos da casa, onde ombreava um tanque.

— Galhardão, vais comer a melhor macarronada da sua vida! E pôs-se a tocar o fogão com a maestria dos grandes chefes.

Logo veio com dois pratos fumegantes, encimado com queijo ralado, para enfeitar a obra. À primeira garfada, entalou na goela e foi tarefa difícil degluti-la. Nixon já partira para o segundo prato e eu ainda engatinhava no meu, já a meio gosto.

— Galhardão, você é frouxo! Não come nada! Macarrão napolitano não é todo dia que faz parte da sua faina! Vai, come tudo! Não me decepcione!

A muito custo, empurrei os compridos de massa rósea pro bucho. E lógico, não quis repetição.

— Galhardão, você não honra a pança que carrega!

— Estava ótimo, Nixon! Sou de comer pouco mesmo!

Da copa, Nixon grita para a moça que já estendia as roupas no varal:

— Cunhadinha, tem alguma sobremesa aí?

— Oh, Nixon! Tem um doce de goiaba na geladeira, num vidro de Karo!

Nixon me mirou com dois olhos esbugalhados, saindo da cara e berrou:

— Galhardão! Nós acabamos de comer macarronada ao molho de goiabada!

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